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Realidade ou Fantasia?

Lendo o artigo A eletricidade natural de estar vivo de Gustavo Gitti pensei muito em como encaramos a realidade que nos cerca e o que somos capazes de fazer com ela. Como já dizia J. L. Moreno a saúde do ser humano está na capacidade de transitar na brecha entre a realidade a e fantasia. Se alguém se perde na fantasia, acaba vivendo com se ela fosse a realidade. Da mesma forma, se vivermos preso demais a realidade, acabaremos por transforma-la em uma fantasia, afinal de contas tudo que percebemos é influenciado pela nossa história e nossos sentimentos. Pensado assim, a realidade não existe já que tudo que acreditamos ser a realidade é a representação do que somos capazes de perceber e sentir. É o transito entre a realidade e a fantasia que nos treina a perceber e questionar nossas percepções, criando o que nos é interessante e revendo aquilo que não nos traz boas formas de conviver com as pessoas e com o mundo.

Brincar de Viver

Deveríamos aprender mais com as crianças, ou talvez não aprender tanto com os adultos!!
Vocês já observaram a seriedade com que uma criança brinca? Como aquilo é tudo de mais importante para ela? Mas, ao mesmo tempo, quando tem de mudar de atividade, mesmo que chore por um tempo, rapidamente ela está brincando de novo, com toda seriedade, uma nova brincadeira.
Porque será que perdemos essa nossa capacidade de nos readaptarmos, de recriar novas realidades com o que temos em mãos?
Tendemos sim a nos acomodar, a nos acostumar até com o que não gostamos. E até nos apegamos com medo do novo não ser melhor, ou dar muito trabalho.
Hoje tem-se falado em Gestão da Mudança!!! Mas o que será isso se não nos permitir o novo, experimentar!!! Vamos arriscar, conscientes sim, mas não engessados pela conserva. Vamos brincar com a vida, brincar com a seriedade de uma criança e a sabedoria de um adulto.

Adesão ao Tratamento


Muito se fala de resistência e adesão ao tratamento, seja na psicologia ou em outras áreas, como a medicina. No caso de doenças crônicas, em geral, esta é uma questão muito delicada. Mas não pretendo falar dos aspectos da adesão ao tratamento médico.
Pretendo falar do quanto nos apegamos a uma determinada forma de agir ou responder a uma situação. Se, em algum momento, aprendemos a reagir assim, de alguma forma isso nos foi útil. Talvez até tenha sido o que de melhor poderíamos ter feito naquela situação*. O problema não é termos agido dessa ou daquela maneira. O que nos atrapalha é continuar reagindo da mesma forma, sem ao menos conseguirmos ver a situação por outro ângulo. Muitas vezes não percebemos que fazemos isso ou, se percebemos, temos muita dificuldade em mudar. É como se o apego àquela situação ou forma de agir fosse mais forte que nós mesmos, como se ela estivesse entranhada em nosso corpo. A psicoterapia vem nos ajudar a entender e lidar com isso, abrindo a possibilidade de agirmos, ou nos permitir o direito de escolher como agir. Neste aspecto, o EMDR se mostra uma ferramenta fantástica.
Mas o que isso tem haver com adesão ao tratamento?
Quantas vezes temos que abrir mão de alguma coisa para seguirmos em frente? Escolher um caminho não implica em renunciar ao outro?
Então vamos ter coragem, coragem pra enfrentar, coragem para nos permitir escolher qual caminho queremos.

*Quando aplicamos EMDR, em geral isso aparece com muita clareza.

Espontaneidade e Adequação


Isso até parece um contrassenso!!! Realmente, mas são palavras que, pelo menos para o Psicodrama, são extremamente atreladas. Quando pensamos num ser humano em relação, a qualidade dessa relação é fundamental para a qualidade de vida.
Moreno dizia que fazer o que me vem à cabeça, quando eu bem entender, não é espontaneidade, e sim o adoecimento dela. Assim, pensar que a espontaneidade, para ser efetiva, deve ser adequada, é pensar que esta adequação não está apenas para o outro ou para quem atua, mas sim para a relação estabelecida.
Pensando por exemplo numa situação de trabalho, muitas vezes o espontâneo criativo está na capacidade de dizer ao chefe uma coisa que ninguém teria coragem de dizer, mas de uma forma que ele seja capaz de ouvir, entender e ainda te agradecer.
(Imagem retirada do Blog Jorge Amaral)

Criar!!! Que bicho é esse??

Tem dias em que a gente se pergunta: “será que existe alguma coisa mais difícil para o ser humano do que mudar?”
É claro que não podemos elencar dificuldades, afinal de contas elas são muito pessoais, mas muitas vezes observamos o quanto as pessoas sofrem ao lidar com a necessidade de uma mudança que, às vezes, não dão conta de realizar.
O que mais assusta é o quanto as crianças são capazes de criar e recriar a realidade, e ao envelhecermos, ficamos cada vez mais rígidos, mais conservados*. Será que queremos nos tornar estátuas vivas? Acredito que a maioria de nós dirá que não.
Ver uma pessoa libertando-se dessa couraça e abrindo-se à possibilidade de criar, arriscando-se de forma espontânea na vida, é um dos melhores retornos que um terapeuta pode ver em seus clientes. Pois a possibilidade de criar pode ser o melhor combustível para a qualidade de vida das pessoas.

* Conservado, para o Psicodrama, é qualquer coisa definida, pronta. Elas são muito úteis, mas se tornam um problema quando tentamos aplicá-las em qualquer situação onde elas podem não ser a melhor saída.
(Imagem retirada do Blog do Frid)

Divisa

Mais importante do que a ciência é o seu resultado,
Uma resposta provoca uma centena de perguntas.

Mais importante do que a poesia é o seu resultado,
Um poema invoca uma centena de atos heróicos.

Mais importante do que o reconhecimento é o seu resultado,
o resultado é dor e culpa.

Mais importante do que a procriação é a criança.
Mais importante do que a evolução da criação é a evolução do criador.

Em lugar de passos imperativos, o imperador.
Em lugar de passos criativos, o criador.
Um encontro de dois: olhos nos olhos, face a face.
E quando estiveres perto, arrancar-te-ei os olhos
e colocá-los-ei no lugar dos meus;
E arrancarei meus olhos
para colocá-los no lugar dos teus;
Então ver-te-ei com os teus olhos
E tu me verás com os meus.

Assim, até a coisa comum serve o silêncio
E nosso encontro permanece a meta sem cadeias:
O Lugar indeterminado, num tempo indeterminado,
A palavra indeterminada para o Homem indeterminado.

Jacob Levy Moreno
(Psicodrama 1987)